Os heróis dos livros da nossa infância



Quando nós éramos meninos, há muitos anos atrás, corríamos atrás das moedas dos nossos pais, para ir ao quiosque da esquina comprar mais um livrinho de aventuras. Não havia televisão e ir ao cinema, só de vez em quando...então os livros de histórias aos quadradinhos povoavam a nossa imaginação, transformando-nos em cowboys desbravadores do Oeste, ou então no xerife destemido que pela força das armas, impunha a ordem nas cidades de foragidos, assaltantes, ladrões de gado, mineiros e caçadores de prémios por cabeça, protegendo e cortejando as damas da terra.

Nomes como Daniel Boone, Bufalo Bill, Kit Carson, Buck Jones ou Roy Rogers montado no seu fantástico cavalo branco, entravam na nossa cabeça, maravilhando-nos com tão grandes e arriscadas aventuras, vencendo sempre as lutas em que se envolviam. Lembro que todos os meninos da minha rua, tinham um "cinturão", duas pistolas de madeira, um lenço da mãe ou irmã para colocar ao pescoço e, alguns, até um cavalo de pau de vassoura com uma cabeça
de cavalo de madeira pintada de qualquer jeito. Mas todos, ou quase todos, queriam ser o xerife, o Zorro (tinham de arranjar uma máscara) ou Buk Jones.


Quando as aventuras aconteciam numa mata próxima de casa, com muitas árvores, arbustos e tocas no meio das pedras, já apetecia mais ser o Daniel Boone ou o David Crockett, nas suas explorações e aventuras de verdade pelo meio do mato, escondendo aqui e acolá.
E havia também os índios, mais difíceis de imitar e que tinham de "morrer" sempre, porque era assim que regra geral acontecia nos livros de cowboys.


E vem isto a propósito dos heróis e dos vilões, dos bons e dos maus. Durante muitos e muitos anos, os cowboys foram os heróis e os peles vermelhas os malfeitores, bandidos assassinos que matavam sem pudor e muitas vezes escalpelizando os pobres colonizadores que, com as suas carroças de madeira se arriscavam na pradaria imensa, à procura de novas terras, de uma nova vida. Não raro, víamos os índios pintados de cores garridas, descendo encosta abaixo, cercando a caravana e atirando flechas em tudo quanto mexia. Eram o terror das terras longínquas do Oeste bravio e o verdadeiro pesadelo dos brancos. Atravessar as terras do Oeste, era uma aventura que podia levar à morte, sem nada conseguir.

E juntamente com os bons colonizadores, andavam pelo Oeste traficantes de armas, vendedores de bebidas alcoólicas, provocadores e aventureiros, capazes de matar sem haver uma razão. O índio era considerado sub-humano, ignorante, selvagem e sem direito a nada, a não ser a morte. Havia um militar dos Estados Unidos que dizia: "um índio bom, é um índio morto!"

Na verdade, e depois de analisarmos mais em detalhe a História dos Estados Unidos e outros países americanos, concluímos que afinal os nossos antigos livrinhos de aventuras não contavam a verdade, mas apenas o que os editores entendiam ser mais conveniente. E o mais conveniente, era que os índios fossem os maus da fita.

Que dizer sobre figuras como Cavalo Louco, Nuvem Vermelha, Cochise, Gerónimo, Touro Sentado e tantos outros, que deram a vida por uma causa, na defesa de uma terra que era sua?
Homens ignorantes sim, mas grandes chefes das suas tribos que conduziam com vigor e sabedoria. Grandes respeitadores da natureza, viviam em harmonia com ela, respeitando-a e assim recebendo as suas benesses.
Homens de honrada palavra que não andavam para trás, depois de fumar o cachimbo da paz e celebrar um acordo. Tantas promessas lhes foram feitas pelos brancos e tantas delas não se cumpriram! O que faríamos nós se víssemos as nossas terras invadidas por seres esquisitos, com canas que botam fogo e matam, mentirosos e que só nos queriam roubar tudo o que era nosso?


Mas os anos passaram, o Velho Oeste não existe mais, os índios foram metidos em reservas e a sua raça quase extinguida. Restam algumas medidas que foram tomadas pelos governos norte-americanos, como por exemplo ter reconhecido Cavalo Louco, que derrotou as tropas do General Custer em Litlle Bighorne, ao lado do Grande Chefe e seu amigo Touro Sentado, mostrando aos brancos a valentia e coragem dos peles vermelhas. Pelo seu brilhante passado, Cavalo Louco foi o escolhido pelo povo índio para em seu nome ser erigida uma monumental estátua, curiosamente construída próximo da Cidade de Custer, no Dakota do Sul!


Considerado um dos maiores monumentos do Mundo, foi integralmente pago com dinheiros particulares e doações, embora o governo federal tivesse posto à disposição dez milhões de dólares, que foram rejeitados pelo escultor da obra, Korkzak Ziolkowvski, que havia recebido a encomenda de um grupo de chefes índios. Este colossal monumento tem 172 metros de altura, por 195 metros de comprimento, e foi talhado directamente na rocha da montanha.

Afinal, depois de tantas aventuras de cowboys aos quadradinhos, podemos hoje pensar com segurança que os vilões de antigamente não eram os peles vermelhas, mas sim os rostos pálidos, que lhes roubaram a sua terra sagrada. A História tem a grande virtude de, com o tempo, deixar passar a verdade.

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